segunda-feira, 30 de maio de 2011

Diário de Viagem - Parte IV - Lago Titicaca

Continuando nossa viagem pelo sul do Peru saímos de Arequipa e fomos, de avião, para Puno - cidade à beira do Lago Titicaca. 


O avião chega em Juliaca, que é uma cidadezinha próxima a Puno. Segundo a moça que fez nosso transfer o aeroporto fica em Juliaca porque a cidade é maior que Puno, pois vive do comércio... sinceramente, a cidade era muito, muito, muito pobre. Não consigo imaginar que tipo de comércio rola por ali, ou o que faz com que ela seja considerada suficientemente grande para receber um aeroporto (claro que o aeroporto é micro, toooodo pequeno, a esteira de bagagens é praticamente na porta do aeroporto! Ali não tem sequer um saguão...). Muita pobreza no sul do Peru.

Chegamos à noite e a Lua estava incrível!! Linda, linda, linda! Enorme, e cheia! Fiquei feliz por pegar lua cheia, já imaginando o visual incrível que teríamos do nosso hotel, que ficava justamente na beira do Lago! Não consegui tirar fotinhos porque minha máquina não é tão super mega master que consiga tirar fotinhos da Lua, à noite... :(

Enfim, chegamos com muito frio! Puno fica a praticamente 4 mil metros de altitude (3.860m - o que torna o Titicaca o Lago navegável mais alto do mundo). Tava frio... frio sério! À noite/madrugada a temperatura chegava aos 2 graus negativos... e olha que ainda nem chegou o inverno!

No dia seguinte acordamos muito cedo - 5:30hs da manhã, saída do hotel às 6:30hs - para nosso passeio pelo Lago. A galera aqui tem essa fixação por acordar muito cedo e sair muito cedo para os passeios!! Já tava ficando (muito) de mal humor, porque eu deteeeesto acordar cedo! Nas férias ainda?! Ninguém merece!!!

Mas, devo confessar que acordar cedo tem suas compensações. Neste dia foi o raiar do sol - sempre muito cedo naquelas altitudes - lindo, bem ali na janela do nosso quarto! Pudemos continuar apreciando do restaurante do hotel - todo envidraçado e debruçado no Lago (aliás, recomendo o Hotel Sonesta Pousada del Inca, até porque Puno não tem muita infra estrutura, então melhor ficar num hotel bacaninha). 



Interessante que em todas as cidades em que fomos, justamente porque os passeios são normalmente bem cedo, os hotéis começam a servir o café da manhã às 5:30hs da matina! Assim não perdemos o café da manhã em nenhum dos dias! Muito simpático e muito profissional, da parte dos hotéis! :)


Saímos cedo do porto de Puno, em direção às ilhas flutuantes que ficam no meio do Lago. 


São aproximadamente umas 50 ilhas que foram construídas e habitadas pelos Uros - um povo indígena da região. A construção se baseia em umas plantinhas que nascem no próprio Lago - a tal da Totora (que eles, aliás, usam pra tudo... para fazer as ilhas, para cobrir as ilhas, para comer, inclusive). 


A engenharia é a seguinte: eles cortam uns nacos desses terrenos onde nascem as tais plantinhas. Nacos de aproximadamente 4m x 4m. Esses terrenos - que mais parecem uns pedaços de xaxim - flutuam... e eles os amarram, com cordas bem fortes (claro!), vários desses nacos, formando as ilhas. A totora que nasce sobre tais pedaços de "xaxim" é cortada, colocada para secar ao sol, e usada como se fosse uma "palha", que recobre toda superfície da ilha. Essa ilhas "duram" cerca de 20 anos, depois eles têm de começar todo trabalho novamente. Só que, pra cortar os nacos de terra, eles têm de pular no Lago... cuja temperatura varia dos 3 aos 13 graus... e mergulhar até uns 2 metros de profundidade... Digamos que os Uros são um povo guerreiro! Beeem guerreiro.

A gente parou em uma das ilhas e eles explicaram como as constroem. Tinha até uma maquete!


Os Uros vivem basicamente de escambo e da venda do artesanato que produzem - seja para os turistas que vão visitar as ilhas, seja no continente (eles têm uns barquinhos maneiros... feitos de quê? Totora... com os quais se locomovem pelo Lago). Estão vivendo por ali há muito... muito tempo (diz a lenda que desde antes de Colombo...), mas vou ser sincera: esqueci de perguntar por quê... digo... porque eles estão ali?! No meio da água (e das noites) geladas?! Sem poder sair daquele pedacinho de ilha?! Sem ter como plantar... sem ter espaço!

Mesmo sem saber porque, aparentemente, essa vidinha um tanto quanto limitada não os afeta tanto... eles são coloridos e felizes! Ou, pelo menos, assim parecem ser... cantaram várias musiquinhas pra gente, nos levaram para conhecer as "ocas" minúsculas em que vivem, e estavam sempre rindo... Pode ser que seja tudo um truque pra gente achar que são assim felizes, e comprarmos mais artesanato, passearmos nos barco deles (e pagarmos por isso)... mas prefiro pensar que pra eles tudo é mesmo, apenas, mais simples...

Umas fotinhos de lá pra vocês entenderem melhor...




Fred degustando sua totora que, na real, não tem
 gosto de nada...  algo como o quarto estado da água...
A casota da Sara e da sua filhota - minúscula!
Cabe todinha na foto (atrás da gente a cama, feita de
totora, e ao lado do Fred um "sofá", feito de... totora).

As ilhas são uma ao lado da outra...
e cada uma tem seu barquinho...

Levando turistas pra um rolé...
10 soles a "passagem".

E esse eles usam para
se locomover, mesmo...










Elas cantando e se despedindo de nós... 

No remo o chefe da ilha

Fred negociando o preço do desenho feito pela
pequena índia... eles aprendem cedo, não?
Depois da visita aos Uros seguimos navegando (mais duas horas) pelo Titicaca até a ilha de Taquile. Descobrimos que, de fato, o Lago é grande! Na verdade ele tem cerca de 8.300 kms quadrados! Chegando à ilha fomos informados que faríamos uma "caminhadinha" para chegar ao topo da ilha... topo... Uma senhora (esperta) já desistiu logo ali... preferiu ficar no barco...

E lá fomos nós... porque afinal, se você vai fazer turismo tem de fazer mesmo! Não pode amarelar e tal... Só que esse povo andino, acostumadíssimo às caminhadas, altitudes, subidas e mais subidas, sempre acha que tudo é uma "caminhadinha"... molezinha... sussa...

E eu, na verdade, não me lembrei do "detalhe" de estarmos a 4 mil metros de altitude quando já estava praticamente enfartando, no meio da subida... Lembrem-se que além da altitude eu (que detesto!) não pratico exercícios regularmente há cerca de 6 meses... e que a "caminhada" era na verdade a subida de uma pirambeira de mais ou menos uns 150 metros de altura (!)... digamos que foi, para dizer o mínimo, mega puxado... 

Teve uma hora - numa das 10 vezes que eu parei para tomar fôlego - que uma mulher parou do meu lado e mandou um "respira..." pra mim... Sério... eu não "esqueci" de respirar! Eu só tava precisando de mais um... ou dois... pulmões! Os meus não davam conta de jeito nenhum!!

Fotinhos do meio do caminho... afinal, era um esquema sobe um pouquinho, descansa um pouquinho... descansa mais um pouquinho... mais um pouquinho... E nesse meio tempo a gente tirava uma fotoca... - olha como já tava longe da água!! Subi moooooito!!!

Pausa para tirar foto (mentira.. pausa para respirar!)

Esses portais são típicos dali...
A gente subindo e eles descendo...
É surreal pensar que o povo da ilha mora lááááá em cima... e pra TUDO eles têm de subir e descer... a gente cruzou um menino descendo com um bujão de gás nas costas!! O cara ia ter de subir depois!!! Tudo que eles trazem de barco - comida, água, roupa, móveis,material de limpeza, etc... - eles levam até suas casas nas costas, subindo essa pirambeira! Enquanto subimos e descemos cruzamos uns velhinhos, no maior pique, subindo e descendo! Que vergonha... 

Mas como marido é tudo na vida, segundo o Fred, o deixei muito orgulhoso porque conseguir subir tudo! Sem reclamar nada (até porque eu simplesmente não conseguia nem falar!), e sem desmaiar nenhuma vez!!  E o visual lá de cima (e o da subida também, que era o que me fez continuar subindo), compensou! Lindo, lindo, lindo!!! Só subi porque eu já imaginava que seria mesmo demais!! :)


A cidade, claro, é muito pequena. As casotas ficam meio espalhadas ao redor da praça principal, que congrega não só a igreja como a sede administrativa e o centro de artesanato (os tecidos da ilha são conhecidos pela boa qualidade).






As roupas deles são bem típicas e identificam as pessoas. Nesta última foto aparecem vários homens sentados na porta da igreja (a construção branca). Os de chapéu preto são os líderes do povoado. E os costumes deles são bem curiosos. Os outros levam esses gorros bem coloridos (como apareceu na foto lá em cima). Se a ponta do gorro pende para um lado quer dizer que o moço é casado. Para o outro, está "à caça". 

Quando ele escolhe a "presa", chega na moça e diz que está interessado. Ela escolhe se vai rolar ou não. Se ela quiser, concorda com a proposta, e o moço vai pedir a mão da moça aos pais dela. Concedida a benção dos pais da moça os dois vão morar junto. Não, eles não se casam imediatamente. Vão morar juntos por 3 anos e nesse período têm de ter pelo menos 1 filho(a) juntos. Se não produzirem um herdeiro são obrigados a se separar. 

É isso mesmo. A moça que decide se quer ou não ficar com o moço e é obrigatório ter um filho antes do casamento, para poder se casar. Modernetes eles, não?!

Se não conseguirem produzir um herdeiro têm de se separar e procurar outro parceiro. Isso tudo porque casamento ali é pra vida inteira. 

Oi?! Pois é... pode ser um contra senso, mas essa é a filosofia do lugar... (casamento só dá certo se tem filho, e se tiver, tem de dar certo pra vida toda... por isso você faz o test drive antes!).

Se, por outro lado, o casal não produziu o herdeiro no prazo que lhes foi concedido, mas está apaixonado e quer viver junto, tem de abandonar a ilha. Ali, só casando (depois de ter um filho, claro).

Passeamos um pouco pela praça, e depois rolou um almocinho básico na casa de um dos locais - sopinha no cardápio! Amém! A essa altura minha enxaqueca já tinha voltado e o frio começava a pegar pesado! Assim, só um caldinho mesmo! Por fim, voltamos para a pirambeira - pelo outro lado - para começar a descida. Parece besteira, mas descer aqueles degraus enormes de pedra irregular, numa altura daquelas, foi difícil!! Cheguei com o joelho em caquinhos! Mas na descida, pelo menos, a vista tava ali, na nossa frente... estávamos debruçados sobre o Lago! Maravilhoso!

Algumas das montanhas, ao fundo, são já na Bolívia...
todas com o cume cheinho de neve!

Tem de comemorar
 (olha o tamanho dos degraus!)
Pirambeeeeeiraaaa!












Sério... era alto mesmo!
No retorno, solzinho no barco...
E friaca no porto!
Ficamos exaustos naquele dia... terminamos a noite na frente da lareira e com um jantar gostoso junto com amigos franceses que fizemos no barco (tão boooom falar francês!!!;)

No dia seguinte, tiramos a manhã de folga! Delícia ficar no jardim, na beira do Lago, aproveitando o solzinho e lendo um livrinho!! 

À tarde fomos para Sillustani. Um sítio arqueológico ali perto, onde haviam ruínas de tumbas dos tempos dos Incas. O lugar fica no meio do nada... é uma península em uma lagoa... e ali nos arredores moram umas 50 pessoas - população local que vive da venda de artesanato para os turistas... Alguns deixam que entremos em suas casas para ver como vivem e com isso também ganham umas moedinhas.

De novo, haja subida - nada comparado à ilha de Taquile, claro! Mas a lógica desse povo era fazer tudo no lugar mais alto, para que ficassem mais perto dos deuses... (e, talvez, para dificultar o acesso dos conquistadores e enxeridos... e, num futuro distante, manter em forma os turistas...).

Na vila todas as casotas tinham esses casal de boizinho e vaquinha no telhado: para trazer harmonia e fertilidade. Compramos nosso casalzinho aqui pra nossa casa! Rs...


Antes de subir, com as tumbas
lá em cima do morro...
À medida em que fomos subindo a paisagem ficava mais linda! E o tempo mais frio... e o vento ventania soprando forte!!! Rs....


Tão lindo que até a Vicunha apreciava...
As torres funerárias demonstram a hierarquia, tão presente nessas culturas incaicas e pré incaicas - a maior era do líder, as menores dos demais. Isso tudo porque os Incas acreditavam em reencarnação. Eram, portanto, enterrados em posição fetal (pois assim que se "chega" em uma vida nova) e com uma série de pertences que precisam quando chegam na nova vida - potes para comida e bebida, tecidos e apetrechos para as moças costurarem, instrumentos de caça e agricultura para os homens, e uma bela esposa e um filho... Sim, é isso mesmo... quando o líder morria escolhiam uma das esposas e um dos filhos para serem sacrificados e enterrados com ele... assim eles já chegavam com companhia na vida nova! E, por isso, no fim das contas, precisavam de uma tumba grande... 

Ah... e, normalmente, os reles mortais levavam um cachorro, que os guiava na entrada da nova vida...

A tumba mais alta, atrás do Fred, era do líder.

Antes de voltamos, vários momentos Kodak, porque a paisagem (incrível!) merecia!






No retorno ao hotel, no meio da estrada, com o sol indo embora e o frio pegando pesado, paramos em uma das casotas que ficava na saída de um povoado, para ver como eles viviam. Eram cerca de 4 construções, em que moravam umas 15 pessoas. Cozinha coletiva, plantação coletiva, llamas e alpacas coletivas... 

Eles mesmo produziam seus remédios, sua comida, o artesanato que vendiam... Um estilo de vida curioso, típico daquele meio do nada... pedacinho de mundo!





À noite voltamos pro hotel, e quando nos preparávamos para um última noite de sono gostoso no hotelzão, fomos surpreendidos pelo telefonema de nossa agente de viagens. Ela nos avisava que por conta de uma manifestação de grevistas, havia o risco de a rodovia que ligava Puno ao resto do mundo, ser fechada pela manhã. 

Os manifestantes haviam chegado à cidade e a baderna estava começando... assim, nosso ônibus que sairia às 7:30hs da manhã, teve sua partida adiantada: sairia às 3hs da madrugada. 

Imaginando o frio miserável que faria à essa hora, o desespero que seria dormir em um ônibus nessas condições, até tentamos uma passagem de avião, mas não deu certo. Como a agente de turismo estava um tanto quanto assustada... achamos melhor partir naquela noite mesmo... Resultado: fizemos as malas, dormimos um pouco e lá fomos nós às duas e meia da manhã para a rodoviária. O programa de índio dispensa maiores comentários. Mas, sorte nossa termos saído, pois de fato a rodovia foi fechada no dia seguinte e até hoje permanece fechada por conta dos grevistas... Os turistas que permaneceram presos na cidade foram resgatados em caminhões do exército que foram enviados para tirar a galera de lá... Os detalhes da viagem eu vou contar só no próximo post, já que nosso passeio em Puno terminou por aqui! 

A cidade é pequena, pobre e dá uma tristeza danada ver tanta gente vivendo tão mal. Mas todos são, como em todos os lugares que passamos, pessoas super amáveis e sorridentes. Claro que eles vivem do turismo e, se assim não fossem dificilmente conseguiriam sobreviver. Por outro lado, não sei de onde eles tiram força pra sorrir... talvez seja da paisagem linda daquele lugar... talvez o sol que brilha o tempo todo e o céu azul que dá uma vontade doida de abraçar! Quem sabe a serenidade é fruto da beleza e do silêncio daquele lugar.... Lindo! Adorei! Espero que vocês também tenham curtido mais essa viagem!

Beijos!
Tila.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Diário de Viagem - Parte III - Monastério de Santa Catalina (Arequipa)

Como promessa é dívida, aqui está o post sobre o Monastério de Santa Catalina! O Monastério fica em Arequipa e foi fundado e 1580 por uma viúva cheia da nota. O estilo de vida ali era duro. Aliás, duríssimo...

As noviças chegavam com 12 anos. Normalmente vinham de famílias abastadas, que pagavam uma pequena fortuna para o monastério - essa "matrícula", e as anuidades que eram pagas no decorrer dos anos, eram utilizados para custear todas as despesas do monastério(alimentos, remédios, tecidos, material para bordados, etc...). Quando as noviças entravam no monastério tinham direito a um quartinho, com cama, cadeira, altar para uma santinha, dois "buracos" na parede que serviam de armário (não sei para guardar o quê, já que elas não tinham praticamente nada), e só. O quartinho tinha uma porta e uma janelinha.

As noviças viviam em completa clausura por 4 anos. E quando eu digo completa, era completa mesmo! Elas recebiam as refeições pela janela. E a porta do quartinho (ou da "cela") ficava permanentemente fechada. Só era aberta uma vez por dia, quando as noviças podiam sair, por uma hora, para assistir à missa (claro!).

A comunicação com a família, por sua vez, era permitida uma vez por mês, através de um locutório. Ou seja, tinha uma grade do lado de cá, e outra do lado de lá, impedindo assim o contato fisico.

Os presentes eram permitidos, e colocados numa espécie de "roleta", que impedia, também, o contato físico. Claro que também haviam limitações em relação ao que podia ser oferecido como presente às noviças e monjas: nada de livros (até porque, elas não aprendiam a ler...), nada de vaidades - nem espelho era permitido (ver seu reflexo num espelho era pecado castigado com pena de banição... tchau tchau monastério... a única imagem das monjas era feita quando morriam, e vinha um "retratista"  que pintava sua imagem).

A conversa mensal com a família  (de uma hora, no máximo), ainda era "fiscalizada" por outra monja. O que, de certa forma, impossibilitava qualquer "assunto proibido", inclusive qualquer reclamação relacionada ao monastério. Uma fotinho desse quartinho, o locutório, com as "grades" à esquerda e a "roleta dos presentes", atrás de mim.


A propósito, era somente por meio desse quartinho que era feito TODO o contato das monjas com o mundo exterior... a roleta dos presentes servia também para que os fornecedores passassem a comida e mantimentos que eram comprados pelas monjas, e tudo o mais que fosse necessário... uma vez dentro do monastério as mojas nunca mais saiam!

A única autorizada a receber visitas - e que tinha uma sala especial (e luxuosa) para isso - era a monja superiora. Ela recebia o bispo, uns padres, e afins.

Voltando às noviças, elas não aprendiam a ler ou escrever. Decoravam o significado de uma série de afrescos que decorava um dos pátios internos do convento. Sua educação se limitava a tais afrescos - na maioria religiosos - e à prendas manuais (bordados, especialmente).

Afrescos no cantinho direito, superior

E era isso que aprendiam... não tinham livros.. o tempo delas era preenchido com rezas... bordados... e só!  Com isso,  haja bordado! Alguns em exposição no monastério (fios de ouro e fios de prata, nos bordados de mantos para as imagens e, eventualmente, para as igrejas da região).




Aliás, os pátios internos do monastério são lindos!! Na verdade, tudo ali tinha mesmo de ser muito lindo, pois pra aguentar essa vida cheia de limitações, só vivendo num lugar bem lindo, mesmo!

Claustro Los Naranjos (por conta das laranjeiras)






Bom, depois dos primeiros quatro anos que as noviças viviam em completa clausura e com todas as privações possíveis, a vida começava a ficar menos pior... dependendo da fortuna da família e de quando elas podiam pagar, as monjas tinham direito a uma "casinha" mais ajeitadinha... ou seja, podiam ter mais cômodos: um quarto, uma saleta e uma cozinha. Tinham direito (até) a suas próprias serviçais. Assim as serviçais cozinhavam uns biscoitinhos e as monjas podiam convidar outras mojas para um papinho e um chazinho... Fotinhos de uma das casotas.

Essa casota era de monja abastada - tinha até piano!


A cozinha, e o forno (embaixo dele eram criados
cuys, uma espécie de porquinho da índia,
 que é prato típico da região)

Lugar curioso do monastério era a lavanderia. A água descia por um canal que era "travado" por uma pedrinha, para encher umas grandes ânforas (de cerâmica), onde a roupa era lavada. 


Ali do lado da lavanderia ficava uma "tina"... onde as serviçais tomavam banho (4 de cada vez), sempre vestidas, claro. Não foi esclarecido onde (e se) as mojas tomavam banho...

Ok... a tina hoje tá cheia de plantinhas aquáticas...
mas dá pra ter uma ideia do perrengue... imagina o frio!!

A partir de 1870 o estilo de vida das monjas mudou um pouco. Passaram a realizar diversas atividades comunitárias... foi montada uma cozinha comunitária, um refeitório comunitário, e elas passaram a viver mais tempo juntas.  Cada dia uma monja era escolhida para recitar passagens da bíblia durante as refeições. Nesse dia ela jejuava. Sópodia beber água... Abaixo fotinho do refeitório.

Confortável o refeitório, viu?

Outro lugar lindo do monastério era o terraço, que ficava sobre a igreja principal. Dali elas tinham uma vista linda da cidade!



O monastério é um lugar lindo! Poucas ruas, cada uma delas com  nome de uma cidade espanhola (Granada, Sevilha, Córdoba...), todas coloridas, floridas e super tranquilas, claro. Reina no monastério todo uma tranquilidade, um silêncio, uma paz... é realmente impressionante.






As monjas, como a maioria dos peruanos,
 eram pequenininhas...




Hoje em dia - na verdade, desde a década de 70, quando o monastério foi aberto para visitação - as monjas vivem em uma parte reservada do monastério. Já não vivem mais em clausura total. Podem sair para ir médico, por exemplo. Entram no monastério a partir dos 18 anos, já sabem ler, escrever (oupodem aprender no monastério) e têm até aulas de computação!

Hoje em dia, afinal, entram no monastério porque querem. Antigamente entravam porque era tradição: a primeira filha casava, a segunda filha era entregue a Deus (acho que era por isso que entravam no monastério aos 12 anos, assim não tinham tempo para conhecer a vida e reivindicar qualquer tipo de liberdade, opinião própria, etc.) e a terceira filha não casava, nem ia para o monastério porque seu destino era cuidar dos pais até sua morte. Da quarta filha em diante as "sortudas" tinham direito ao livre arbítrio.

Ironia, ou não, no monastério tem um confessionário. Mas, fala sério, dá pra imaginar que essas monjas, que viviam enclausuradas, não conheciam ninguém além de outras monjas e da família, não conheciam nada da vida, teriam algum pecado pra confessar? Segundo nossa guia: pecados da mente. Podia rolar uma invejinha da casota da outra, do jogo de chá que a outra tinha ganho da familia, e sabe-se lá mais o quê...

A confissão era feita, claro, através de uma parede, para padres que ficavam do lado de fora do convento...


Com ou sem pecado, a verdade é que os sacrifícios eram (e são) recompensados com um ambiente de muita paz e tranquilidade. Gostamos muito do monastério. Ficamos um tempão passeando por ali... não dá vontade de sair... parece que você está em outro mundo! Sem dúvida um passeio que vale a pena, se você estiver por Arequipa!

Beijos,
Tila.